quarta-feira, 19 de novembro de 2014
O fenômeno da morte
Presente e constante na existência humana, o fenômeno da morte constitui uma fatalidade da qual ninguém consegue eximir-se.
Ocorrendo a cada momento nas células, que também se renovam, ocasião chega em que a anóxia cerebral se encarrega de parar as funções do tronco encefálico, interrompendo a ocorrência biológica da vida física.
Todos os seres que nascem morrem, dando prosseguimento ao milagre da vida em outra dimensão, aquela de onde tudo procede.
O objetivo essencial da existência física, em consequência, é a construção e a vivência dos valores éticos responsáveis pelo progresso incessante do Espírito até o momento em que alcança a plenitude.
Mesmo nos reinos vegetal e animal, o processo de nascimento e morte obedece à planificação do desenvolvimento evolutivo da essência divina presente em tudo e em toda parte como fundamental manifestação da vida.
Desde quando criado o ser, o deotropismo atrai-o com força dinâmica inescapável…
Ao atingir a fase do instinto, desenham-se-lhe no psiquismo, pelas experiências, os pródromos da razão, passo gigantesco no rumo da angelitude Fixar os valores que dignificam e elevam, que o libertam das heranças grosseiras da fase antropológica primitiva, torna-se-lhe, portanto, imposição inevitável que o arrasta no rumo da ascese, que se lhe constitui meta a ser conquistada.
Passo a passo, experiência após vivência, a ânsia de alcançar a paz e a sabedoria estimula-o ao prosseguimento, mesmo quando sob ações penosas do sofrimento, decorrente da desatenção e da rebeldia ante as leis que regem o universo.
Parte integrante do Cosmo, essa unidade minúscula que é o ser humano, à semelhança de uma micropartícula que forma a unidade atômica, deve manter a sua constância sob o comando da consciência lúcida que reflete o estágio em que se encontra.
As ocorrências desastrosas por falta de discernimento, por teimosia dos instintos agressivos, retardam-lhe a marcha, sem dúvida, porém, não impedem que ocorram novas oportunidades vigorosas em provações ou expiações pungitivas que se encarregam de corrigir as anfractuosidades morais e os desvios comportamentais, impondo a conduta correta como a solução adequada para o equilíbrio e o bem-estar.
Viver é automático, porém, bem viver, selecionando as questões que promovem os sentimentos e a inteligência em níveis mais elevados, para a conquista da sabedoria, deve ser o objetivo de máxima importância para todo viajante na indumentária carnal.
Sócrates, totalmente lúcido e decidido a demonstrar a sua grandeza moral em fidelidade atudo quanto ensinou e viveu, recebeu a morte como um grande bem.
Instado a fugir por Críton, que houvera organizado um plano audacioso com os seus demais amigos, surpreendeu-se e o repreendeu, demonstrando que as leis, mesmo quando injustas, devem ser obedecidas, de modo que a sociedade aprenda a estabelecer códigos de nobreza.
Caso fugisse, evidenciaria que era realmente o que dele diziam os inimigos, especialmente aqueles que o levaram ao tribunal com infâmias grosseiras.
E sofismando a respeito da existência, qual fizeram antes os juízes, anuiu com tranquilidade à sentença infame, demonstrando que a existência física é uma experiência de iluminação e não uma pousada para o prazer infinito.
Buda, de igual maneira, despedindo-se dos discípulos que aguardavam mais informações, a fim de darem continuidade à divulgação dos seus pensamentos, informou que lhes legava o dharma – a ordem universal imutável – e, serenamente, abandonado por muitos que antes o assistiam, silenciou a voz e retornou à pátria da imortalidade.
Jesus é o exemplo máximo, porque no auge dos sofrimentos pôde pronunciar frases que assinalariam com vigor a sua despedida, desde o perdão aos crucificadores “que não sabiam o que estavam fazendo” (Lucas, 23:34), até entregar a mãezinha aos cuidados
do discípulo amado e este ao seu carinho (João, 19:26-27), rompendo os laços da consanguinidade terrestre em favor da fraternidade universal.
Foi mais além, dialogando com o ladrão que lhe suplicava ajuda e socorrendo-o com a resposta da sublime esperança da sua entrada no reino dos Céus (Lucas, 23:43), assim que se desvencilhasse das asperezas dos erros, e se cumprisse tudo para quanto viera, num inolvidável silêncio após o “tudo consumado” (João, 19:30).
Logo mais, porém, retornava em júbilo na madrugada esplendente de sol e de beleza, confirmando a imortalidade e o triunfo da vida sobre contingência material, de modo que os amigos e quantos outros que o viram pudessem superar a injunção corpórea e voar nos rumos do Infinito.
Francisco de Assis, sofrido pela ingratidão de alguns dos melhores companheiros, ferido e maltratado, sem forças nem resistências orgânicas, exauriu-se lentamente, cantando sempre até o último hausto, a ponto de ser censurado por tanta alegria…
Todos aqueles que descobriram a imortalidade enfrentaram o fenômeno da consumpção dos tecidos orgânicos com estoicismo e naturalidade, alegrando-se com o término da tarefa terrestre abraçada, de modo a retornarem vitoriosos ao Grande Lar de onde partiram no rumo do planeta terrestre.
Reflexiona diariamente a respeito da tua partida em direção à imortalidade, preparando-te, a fim de que não te fixes em interesses mesquinhos retentivos da retaguarda material.
Treina o pensamento em considerações constantes em torno da desencarnação, porquanto ela chegará, talvez, quando menos a esperes.
Se tiveres a felicidade de enfermar por longo prazo, diluindo os liames retentivos do corpo físico, isto será uma bênção.
Mas se fores convocado repentinamente, deixa-te conduzir com alegria, certo de que viverás.
Nada obstante, prepara-te conscientemente para enfrentar esse fenômeno terminal, agradecido ao corpo que te vem servindo de instrumento para a evolução, bem como a tudo quanto te ocorre na atual conjuntura evolutiva.
Joanna de Ângelis
(Página psicografada pelo médium Divaldo Pereira Franco, na tarde de 2 de junho de 2014, na residência de Dominique e Armandine Chéron, em Vitry-sur-Seine, França.)
Texto extraído da Revista Reformador, edição de novembro de 2014
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